quarta-feira, 2 de outubro de 2019

A Emenda Constitucional 102/2019 e a falsa impressão de dotações orçamentárias plurianuais.

Por: Jorge de Carvalho* (TCMSP) e Leandro Menezes** (TCE-PR)



A Emenda Constitucional (EC) 102, de 26 de setembro de 2019, alterou o art. 165 da Constituição Federal, muito conhecido no setor público por estabelecer regras atinentes ao sistema de planejamento que deve nortear as ações governamentais, notadamente no que concerne aos planos plurianuais, às leis de diretrizes orçamentárias e às leis orçamentárias anuais. 

Entre as modificações engendradas pela referida Emenda, destaca-se a inserção do § 14 ao art. 165, cujo texto é o seguinte:


§ 14. A lei orçamentária anual poderá conter previsões de despesas para exercícios seguintes, com a especificação dos investimentos plurianuais e daqueles em andamento.

Esse parágrafo suscitou muitas dúvidas entre os profissionais que atuam no setor público, sobretudo quanto a uma possível colisão com o disposto no art. 34 da Lei Federal 4.320/64 (Estatui Normas Gerais de Direito Financeiro para elaboração e controle dos orçamentos e balanços da União, dos Estados, dos Municípios e do Distrito Federal), que define a anualidade dos ciclos orçamentários:

Art. 34. O exercício financeiro coincidirá com o ano civil.


O texto da EC realmente dá margem a variadas interpretações e, para aclarar o intento do legislador, faz-se importante recorrer ao parecer da Comissão de Constituição e Justiça do Senado Federal (SF/19203.00215-75), o qual subsidiou a aprovação do novo texto constitucional. Transcreve-se o seguinte trecho do mencionado parecer:


Ademais, vale notar que, enquanto a lei orçamentária fixa a despesa para o exercício a que se refere, para os dois exercícios financeiros ela trará uma previsão (sem caráter vinculante) de despesas, com detalhamento dos investimentos.

[...]

Essas mudanças, de certa forma, estão alinhadas com a revogação do § 1º do art. 167, que prevê que nenhum investimento cuja execução ultrapasse um exercício financeiro poderá ser iniciado sem prévia inclusão no plano plurianual, ou sem lei que autorize a inclusão. Com isso, o novo sistema orçamentário traz para o orçamento anual e a respectiva lei de diretrizes orçamentárias a previsão e a orientação dos investimentos, incluindo os planos plurianuais.

Logo, as futuras leis orçamentárias NÃO DEVERÃO conter dotações que extrapolem o período ao qual se referem, encontrando-se em pleno vigor o entendimento consagrado no art. 34 da Lei Federal 4.320/64. O que muda é a inserção da previsão plurianual de investimentos à peça orçamentária, documento apartado que não produz efeitos no que tange à fixação da despesa nos moldes tradicionais, mas que pode contribuir para a elaboração das metas fiscais dos dois próximos exercícios (conforme disposição do § 1º, art. 4º da Lei de Responsabilidade Fiscal).

Sobre os autores:

* Jorge de Carvalho é auditor do Tribunal de Contas do Município de São Paulo (TCMSP) e criador deste Blog. Contato: profjcarvalho@hotmail.com

** Leandro Menezes é auditor do Tribunal de Contas do Estado do Paraná (TCE-PR). Contato: leandro.menezes@tce.pr.gov.br

Obs.: a opinião dos autores desse artigo não reflete o posicionamento oficial dos órgãos de controle nos quais atuam.

Um comentário:

  1. Essa inserção não teria sido em função das emendas parlamentar? é sabido que na prática é plurianual(convênios)rs sugestão amarrar só para emendas parlamentar no caso de investimentos.

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