quarta-feira, 2 de janeiro de 2013

Reflexão histórica sobre a profissão contábil no Governo Federal.

Por: Paulo Henrique Feijó


Antes de tecer meus comentários sobre a exigência ou não de profissionais de contabilidade para a área contábil na STN, fruto de grandes debates neste grupo, gostaria inicialmente de afirmar que:

a) Diante do modelo adotado no Brasil de reserva de mercado para várias profissões (economistas, administradores, nutricionistas, advogados, contadores,...), sou a favor de que o exercício da profissão contábil seja feito por contadores;

b) Acho lamentável o edital do concurso da STN não cobrar CASP nem AFO.

No entanto, penso que o grande problema deveria ser resolvido na raiz e não com a poda dos galhos. A raiz recente (últimos 30 anos) do problema da profissão de contador no governo federal vem pelo menos desde a criação da Secretaria do Tesouro Nacional - STN, em 1986, denominado Departamento do Tesouro Nacional - DTN. O cargo de Contador no governo federal existia e existe até hoje sendo privativo de contadores, no entanto o salario é baixo.

Vou me arriscar, mesmo sem ter vivido o processo de criação da STN a relatar uma perspectiva histórica, com a humildade e certeza de que meus equívocos serão corrigidos pelo professorDomingos Poubel de Castro.

No fim dos anos 80 o MF, representado pela STN/DTN cuidava das atividades de administração financeira, contabilidade e controle interno. O Ministério do Planejamento das atividades de planejamento e orçamento.

Assim, quando ingressei na carreira de finanças e controle, em 1993, como Técnico de Finanças e Controle – TFC, as atividades de controle interno eram coordenadas pela COAUD, que era uma coordenação de auditoria dentro da STN, portanto subordinada ao Secretario do Tesouro Nacional. Vejam o absurdo! Com a crise do Governo Collor em 1992 se criaram as condições para que fosse realizado o sonho de se criar a Secretaria Federal de Controle - SFC (processo histórico que pode ser encontrado no livro do professor Domingos Poubel). Portanto, o sistema de controle interno deixa de ter a STN como órgão central que passa a ser exercido pela SFC, cujo primeiro Secretário foi Domingos Poubel.

Na época houve discussão se a Contabilidade iria para a SFC ou ficaria na STN e, segundo relatos dos que viveram este momento, o principal motivo para que a contabilidade permanecesse na STN, foi que a STN não queria perder a gestão do Siafi, que é um sistema eminentemente contábil.

Para organizar estes processos no Governo federal foi editada Medida Provisória, salvo engano em 1994, que foi sucessivamente reeditada até torna-se em 2001 a Lei 10.180. A referida Lei ratifica o MPOG como órgão central de planejamento e orçamento, a STN como órgão central de administração financeira e de contabilidade e a SFC como órgão central de controle interno.

Atualmente, para cuidar do PPA federal tem-se a Secretaria de Planejamento e Investimentos Estratégicos – SPI; para cuidar do Orçamento Federal tem-se a Secretaria de Orçamento Federal – SOF; para cuidar do controle interno tem-se a Secretaria Federal de Controle - SFC, que ganhou tanta força que as atividades se ampliaram e se transformou em Ministério; para cuidar da administração financeira tem-se a STN; e para cuidar da contabilidade? Já que não criaram uma secretaria então deixa a STN cuidando...

Assim, as carreiras para se desenvolver estas atividades são: Analista/Técnico de Planejamento e Orçamento – APO, que trabalha em geral na SPI e SOF ou nos órgãos setoriais. Analista/Técnico de Finanças e Controle – AFC/TFC, que trabalha na STN e SFC, ou órgãos setoriais.

Quando exerci o cargo de Coordenador-Geral da CCONT na STN num dos concursos tentei ver a possibilidade de se restringir o acesso à área contábil somente para contadores, mas na época me disseram que existia um parecer da PGFN contrário, pois o cargo de AFC, pelas suas atribuições não permitia. Acho possível construir algo diferente se houver vontade institucional, mas não sei se existe.

Vale ressaltar que nestes 6 anos trabalhando diretamente com contabilidade encontrei profissionais que não tinham formação contábil (engenheiros, dentistas, economistas,...) e que no dia a dia eram muito melhores do que muitos contadores da equipe e alguns deles se tornaram contadores ao longo do tempo.

Apenas para citar um grande exemplo, a gerente que consolidou o Manual dos Demonstrativos Fiscais - MDF e depois se tornou minha substituta,Selene Peres Peres Nunes, é Doutora em economia, uma das maiores especialistas em LRF (ajudou ativamente no texto da Lei) e quando foi trabalhar na CCONT não era contadora. Em seguida começou um curso de graduação e recentemente se formou. Será que uma profissional com essa qualificação não poderia trabalhar na Coordenação de Contabilidade da STN? É por essas e outras que acredito que há atividades que são específicas da contabilidade, mas existem outras dentro do setor contábil que podem ser exercidas por outros profissionais tão ou mais competentes. No fim, em qualquer das profissões há uma grande busca por reserva de mercado. Nunca devemos esquecer que existem países que não exigem diploma de nível superior para exercer trabalhos contábeis, bem como em outras profissões. Não confirmei, mas lembro de uma aula na UnB em que o professor citou que na Alemanha somente se exige diploma de nível superior para as profissões que envolvem risco de vida (médico, engenheiro civil,...). Este foi um debate na época da constituinte de 1988, mas se ratificou na Constituição Federal a necessidade de diploma para o exercício profissional e isso já é ponto superado, não estando em discussão. Apenas citei para mostrar que não há consenso mundial sobre o tema, pois tem muito de aspectos culturais.

O fato é: goste ou não, no Brasil, o exercício das atividades de contabilidade deve ser realizado por contador. E o que fazer para resolver o problema do exercício da profissão no Governo Federal? Hoje estou convicto de que o caminho é seguir a ideia do Professor Domingos Poubel: Criar a Secretaria de Contabilidade Federal – SCF. Uma vez criada pode-se dizer que nesta Secretaria só poderão ingressar contadores!

Desculpem os planejadores e orçamentistas, mas fazer uma contabilidade de excelência é mais complexo que fazer um PPA e um orçamento de excelência. Então, porque existem secretarias específicas para se fazer o PPA (SPI) e o Orçamento (SOF) e não existe uma específica para a Contabilidade? Os idealizadores da Lei 10.180 dizem que este era o objetivo: Um órgão para cada sistema organizacional. Só falta o da Contabilidade!

Assim, o edital do concurso da STN deve ser mudado mesmo, pois nunca na história da STN houve concurso que não cobrasse Contabilidade Pública. Porém, para resolver o problema do exercício profissional o Sistema CRC/CFC deveria brigar pela criação da SECRETARIA DE CONTABILIDADE FEDERAL. Na minha modesta opinião, esta deveria ser a principal luta!

Fonte: Facebook - Grupo de Contabilidade Aplicada ao Setor Público

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