Por: Prof. Jorge de Carvalho
Nas
hipóteses em que o software contábil único for contratado junto a empresas
privadas, com rateio das despesas entre os Poderes, a execução da despesa deve
ocorrer preferencialmente por meio de descentralização orçamentária e
financeira
As disposições que tratam sobre o padrão mínimo de qualidade do Sistema Único e Integrado de Execução Orçamentária, Administração Financeira e Controle (SIAFIC), exigido no § 6º do art. 48 da Lei Complementar 101/00 e regulamentado pelo Decreto Federal 10.540/20, estão plenamente vigentes desde 1º de janeiro de 2023.
Com a eficácia dos requisitos normativos, muitas dúvidas têm surgido a respeito de várias nuances da regulamentação vigente. Uma delas, reside na forma tecnicamente mais adequada de contabilizar as situações envolvendo o rateio de despesas (por exemplo, entre a Câmara Municipal e a Prefeitura), quando o software é contratado junto a empresas privadas.
Uma hipótese aventada por alguns profissionais de contabilidade que atuam no setor público é a do registro como operação intraorçamentária. Entretanto, esse tipo de operação se verifica nos casos de aquisição de materiais, bens, serviços, pagamento de impostos, taxas e contribuições quando ambas as partes envolvidas no processo integrarem o mesmo Orçamento Fiscal e da Seguridade Social (OFSS), como resultado de uma relação contratual/tributária direta entre elas.
Ou seja, para ser caracterizada como operação intraorçamentária no caso concreto, a prestação do serviço de cessão de uso do software contábil deveria decorrer de uma relação direta, por exemplo, entre Prefeitura e Câmara Municipal. Não é o que se verifica na contratação de solução tecnológica junto a empresa privada, onde esta é quem fornece o serviço aos dois Poderes.
Nesse sentido, a boa técnica contábil e orçamentária sugere o registro do rateio de despesas do SIAFIC entre os Poderes (desde que contratualmente amparado) por meio do instituto da descentralização orçamentária e financeira.
Nos termos do item 3.6.7, Parte I do MCASP 9ª ed, as descentralizações de créditos são utilizadas para execução de ações de responsabilidade do órgão, fundo ou entidade descentralizadora, efetuadas no âmbito do respectivo ente da Federação e ocorrem quando for efetuada movimentação de parte do orçamento, mantidas as classificações institucional, funcional, programática e econômica, para que outras unidades administrativas possam executar a despesa orçamentária.
Segundo o MCASP,
Quando a
descentralização envolver unidades gestoras de um mesmo órgão tem-se a
descentralização interna, também chamada de provisão. Se, porventura, a
movimentação de crédito ocorrer entre unidades gestoras de órgãos ou entidades
de estrutura diferente, ter-se-á uma descentralização externa, também
denominada de destaque. Na descentralização, as dotações serão empregadas
obrigatória e integralmente na consecução do objetivo previsto pelo programa de
trabalho pertinente, respeitada fielmente a classificação funcional e por
programas. Portanto, a execução da despesa orçamentária será realizada por
outro órgão ou entidade.
Com isso, em um contrato celebrado entre o Poder Executivo e uma empresa privada para fornecimento do SIAFIC, no qual estejam presentes as dotações tanto deste Poder quanto do Legislativo, havendo, por conseguinte, a previsão de rateio entre as partes envolvidas, o Legislativo deverá descentralizar parte de seu orçamento para que o Executivo promova o empenho da despesa, mantidos os classificadores aprovados na estrutura orçamentária do Poder Legislativo. Adicionalmente, deverá ser promovida a descentralização financeira, para viabilizar o pagamento ao fornecedor.
Operacionalmente, o procedimento demanda a existência de documento próprio no software contábil que possibilite a efetivação da descentralização e a sua consequente contabilização, envolvendo as contas contábeis dos subtítulos 5.2.2.2.1.00.00/6.2.2.2.1.00.00 ou 5.2.2.2.2.00.00/6.2.2.2.2.00.00, nos casos de provisão ou destaque, respectivamente, além da conta 6.2.2.1.1.00.00 – Crédito Disponível (contas do PCASP Estendido de 2023).
Exemplificativamente, no Estado do Rio de Janeiro os procedimentos operacionais correlatos à descentralização de créditos orçamentários constam da
Nota Técnica Sunot/CGE 021/2016. No referido Ente, que utiliza o software Siafe-Rio (SIAFIC do Estado do Rio de Janeiro), a descentralização é executada no sistema por meio do documento “DC – Nota de Descentralização de Crédito”, a qual automaticamente identifica se a transferência orçamentária caracteriza provisão ou destaque, a depender dos órgãos e entidades envolvidos.
Em âmbito federal, a descentralização de créditos entre órgãos e entidades integrantes do OFSS da União foi disciplinada pelo Decreto Federal 10.426, de 16 de julho de 2020, o qual preconiza que tal instituto será utilizado, entre outros, para fins de ressarcimento de despesas.
Vale ressaltar que, se os contratos já existentes com as empresas fornecedoras dos softwares contábeis não contemplarem dotações de outros Poderes para viabilizar o rateio, é possível modifica-los unilateralmente por meio de apostilamento, para inclusão das classificações orçamentárias da despesa, nos termos do Inciso I, art. 104, combinado com o Inciso IV do art. 136 da Lei Federal 14.133/21.
Muito esclarecedor. Excelente conteúdo.
ResponderExcluir👏👏👏👏👏👏 cirúrgico como sempre.
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