“Vamos procurar as nossas convergências com maturidade, sabedoria e confiança recíproca. Todos queremos o aprimoramento dos Tribunais de Contas com Colegiados, Auditorias e Ministério Público de Contas fortes. Essa é uma causa coletiva, sem herois”. Assim, o presidente da Atricon, Valdecir Pascoal, pediu a união de todo o sistema de controle em torno de uma proposta de reforma constitucional “ousada e equilibrada”, mas que preserve os avanços conquistados desde a promulgação da Constituição Federal de 1988.
A declaração foi feita no fórum “A reforma dos Tribunais de Contas e a criação de um novo modelo de controle externo para o Brasil”, que aconteceu no Salão Nobre da Faculdade de Direito da USP, no Largo do São Francisco, promovido pelo Departamento de Direito Econômico, Financeiro e Tributário na noite da segunda-feira (29). O debate, que foi mediado pelo professor titular de Direito Financeiro da USP, Heleno Torres, contou também com a participação do procurador do Ministério Público de Contas junto ao TCU e presidente da Ampcon, Júlio Marcelo de Oliveira, e a presidente da AUD-TCU, Lucieni Pereira.
Além dos palestrantes, participaram do debate o professor José Maurício Conti, o ex-ministro da Advocacia-Geral da União, Luís Inácio Adams, o conselheiro-substituto do TCE-SP, Alexandre Sarquis e o professor de pós-graduação da Unimar e membro do Conselho Municipal de Tributos do Município de São Paulo, Jonathan Vita. A plateia foi composta por professores e alunos dos cursos de Direito e Economia.
O presidente da Atricon definiu como “histórica” a oportunidade de ter os três grandes pilares do controle externo — Julgamento, Auditoria e Ministério Público Especial — “debatendo com transparência e respeitosamente os novos rumos para os Tribunais de Contas (TCs), não obstante as diferenças pontuais quanto ao diagnóstico e a forma e extensão das medidas”.
Valdecir Pascoal começou sua palestra ratificando que “não é de hoje o compromisso da Atricon com o aperfeiçoamento do sistema, e a maior prova disso é o Programa Qualidade e Agilidade dos Tribunais de Contas (QATC), que já foi apresentado aqui na USP”. Segundo o conselheiro, a palavra de ordem deve ser aprimoramento, o que significa reformar sem deixar de reconhecer os avanços.
“É preciso sermos justos em nossos diagnósticos. Os TCs evoluíram muito, sim, desde a Constituição de 1988. Nós, na Atricon, somos testemunhas disso. Os TCs estruturaram seus quadros técnicos, passaram a atuar preventivamente, fazendo ‘biópsia em vez de autópsia’ sobre os atos de gestão, avaliam políticas públicas por meio das auditorias operacionais, criaram as escolas de contas, e tem trabalhado para promover a transparência e o controle social”. afirmou. “Tanto é verdade, que na crise aguda que atravessamos, não se fala mais em extinção de TCs”, completou.
Ele criticou as generalizações que surgem em tempos de crise. “Momentos assim são propícios à radicalização dos diagnósticos. Esse tipo de conclusão acaba sendo uma injustiça com as centenas de servidores e membros que atuam republicanamente. É preciso bom senso e responsabilidade”, declarou.
PROPOSTA — Em seguida, Pascoal detalhou o texto-base elaborado pela Atricon para uma nova Proposta de Emenda Constitucional (PEC) que reforma o sistema de controle externo a partir da criação do Conselho Nacional dos Tribunais de Contas (CNTC), de mudanças nos critérios de composição dos colegiados e da previsão de uma Lei Nacional Processual de Contas.
CNTC x CNJ — Em primeiro lugar, o presidente da Atricon criticou a proposta de vinculação dos TCs ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ): “Essa ideia constitui uma afronta ao princípio constitucional da autonomia e separação dos poderes, já que os TCs não fazem parte do Poder Judiciário. Além disso, por falta de experiência em processo de contas e de conhecimento da realidade do controle externo, os membros do CNJ não estarão aptos para exercerem atribuições sobre, por exemplo, o desempenho dos TCs”, explicou.
Ele defendeu a criação de um Conselho Nacional específico para os TCs. “Esse Conselho terá a atribuição de responsabilizar os seus membros por irregularidades e desvios éticos; fiscalizar os atos de sua gestão administrativa e financeira; estabelecer metas nacionais de desempenho; dar máxima transparência aos atos de gestão e de fiscalização dos TCs. Por fim, nossa proposta prevê uma câmara com a função de uniformizar a jurisprudência sobre temas de repercussão nacional”, afirmou Pascoal, lembrando que o CNTC terá pequeno impacto sobre as contas públicas, já que funcionará no TCU, não haverá remuneração para seus integrantes e o custeio de eventuais deslocamentos será feito pelas entidades nele representadas. As sessões serão preferencialmente virtuais.
COMPOSIÇÃO — O presidente da Atricon defendeu um redesenho dos colegiados dos TCs que garanta a maior parte dos assentos aos membros oriundos das carreiras técnicas — membros-substitutos, procuradores de contas e auditores de controle externo. As carreiras ocuparão cinco vagas no TCU (onde o colegiado é composto por nove ministros) e quatro vagas nos demais Tribunais (compostos por sete conselheiros).
A proposta da Atricon prevê ainda o fim das indicações livres do chefe do Executivo e a redução das indicações do Legislativo, fixando critérios mais rigorosos para estas últimas. Entre eles, uma quarentena de três anos afastado de mandato eletivo, não ter sido condenado judicialmente, nem ter tido contas reprovadas. Além disso, os nomes precisarão de maioria absoluta para aprovação e deverão ter graduação e experiência nas áreas jurídica, contábil, econômica e financeira ou de administração pública, como forma de aferir o “notório conhecimento” ditado pela Constituição.
“Esses são filtros que queremos estabelecer para tornar os TCs órgãos ainda mais efetivos e independentes, como deseja a sociedade. Não devemos, no entanto, demonizar’ a atividade parlamentar. A maioria absoluta dos membros oriundos do Legislativo cumpre com excelência as suas funções e a experiência parlamentar e de gestão pública, na proporção correta, qualifica o processo de contas”, declarou Pascoal.
LEI PROCESSUAL — Antes de concluir a apresentação, Pascoal defendeu ainda a definição de uma Lei Processual de Contas. “É preciso uma padronização do processo de controle externo”, afirmou. Essa padronização, segundo ele, será iniciativa do TCU e deve funcionar como “uma espécie de Código de Processo Civil” dos Tribunais de Contas. A Lei Processual também deverá fixar tipologias e questões “ainda não pacificadas” como Contas de Gestão e Contas de Governo. “O objetivo da padronização é reduzir as assimetrias que existem no sistema e garantir mais segurança a todo o processo de contas”, definiu o conselheiro.
CONVOCAÇÃO — Valdecir Pascoal concluiu a sua apresentação afirmando que os TCs têm diante de si uma oportunidade única. “Neste momento, vale a máxima grega escrita no Oráculo de Delfos: “conhece-te a ti mesmo”. E também a sabedoria da moderação: “nada em excesso”. Vamos respeitar as divergências, que são pontuais, e nos unir em torno do interesse comum, que é o aprimoramento do sistema de controle externo. Não podemos perder esta oportunidade. Repito: essa é uma causa coletiva. Estamos com o apoio da sociedade, da academia, da imprensa, e o nosso grande desafio será a sensibilização do Congresso Nacional. Estamos esperançosos. Sentimos o vento de uma nova e republicana aurora para os TCs”, concluiu.
Fonte: ATRICON - Associação dos Membros dos Tribunais de Contas do Brasil
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