A Lei de Responsabilidade Fiscal, de 2000, subsidiou o processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff, com a criminalização das “pedaladas fiscais” e da edição de decretos para abertura de crédito suplementar sem a aprovação do Congresso Nacional. Em artigo publicado pelo Instituto Braudel, o economista Cesar van der Laan, defendeu o importante marco para o equilíbrio das contas públicas e o estabelecimento de marcos complementares aos instituídos na legislação.
“A flexibilização da austeridade e a concomitante deterioração das contas públicas demonstram que a manutenção do equilíbrio fiscal ainda depende de novos avanços orientados ao fortalecimento do ambiente institucional público”, afirmou.
A LRF constitui um dos mais relevantes marcos para o equilíbrio das contas públicas. A partir dos anos 2000, a busca pelo equilíbrio das contas públicas deixou de ser apenas um discurso e passou a estar efetivamente institucionalizada como um próprio código de conduta fiscal de observação cogente pelos gestores públicos em todos níveis federativos. Os destaque ficam com os limites de despesas de pessoal e de endividamento que passaram a ser regra rígida.
Para van der Laan, contudo, pilares institucionais ainda não foram ainda constituídos. É o caso do conselho de gestão fiscal para o acompanhamento e a avaliação, permanente, da política e da operacionalidade da gestão fiscal. O conselho seria constituído por representantes de todos os Poderes e esferas de Governo, do Ministério Público e de entidades técnicas representativas da sociedade, nos termos de lei ordinária. Referida lei, contudo, não foi editada e o CGF não foi instituído, passados mais de 15 anos após a edição da LRF.
Recentemente, entretanto, a concepção de conselho de gestão fiscal acabou perdendo força diante dos debates em torno da Instituição Fiscal Independente (IFI). Essa alternativa passou a ser discutida pelo Senado Federal, em 2015, e foi recentemente aprovada em 2016, nos termos do Projeto de Resolução do Senado nº 61, de 2015. A instituição terá caráter técnico e auxiliará o Senado em sua competência de fiscalização do Executivo, reforçando o acompanhamento legislativo das contas públicas, que hoje carece de uma institucionalidade mais efetiva.
“No presidencialismo de coalizão, a IFI pode mitigar o descompromisso dos parlamentares com o ciclo fiscal, muito mais afetos a ganhos políticos de curto prazo do que com o efetivo controle fiscal-orçamentário”, explica o consultor legislativo.
Outro ponto é a indefinição quanto ao limite do montante da dívida consolidada da União, exigido pelo art. 48, XIV, da Constituição. Van der Laan aponta a preocupação em relação à factibilidade e ao impacto do nível de endividamento definido – de 4,4 da Receita Corrente Líquida (RCL) para a dívida bruta –, ainda que seja bem mais amplo do que o estabelecido para os Estados e Municípios (de 2 e 1,2 RCL, respectivamente), para comportar suas atribuições de gestão macroeconômica.
“Ainda que a definição do indicador envolva incerteza, trata-se de um número crível, que é bem superior ao valor inicialmente apresentado na proposta inicial do Executivo, de 3,5 RCL quando o endividamento estava na ordem de 2 RCL e a preocupação era de ser muito elevado e estimular ainda mais o endividamento da União. O cenário, hoje, é outro, com a deterioração do estoque da dívida para o patamar de 6 vezes a RCL, mostrando a conveniência e a necessidade do novo limite legal”, afirma.
Nova Lei de Finanças Públicas
No artigo, Van der Laan também destaca a tramitação no Senado Federal do Projeto de Lei Complementar (PLS) nº 229, de 2009, que visa introduzir nova lei geral de finanças públicas. O texto estabelece normas sobre orçamento, controle e contabilidade pública, além de contemplar temas como planejamento e orçamento; execução orçamentária; contabilidade e classificação da receita e da despesa. Ainda abrange aspectos relativos ao reconhecimento e pagamento de obrigações de exercício anterior, e diretrizes contábeis aplicáveis a fundos públicos.
“Sua introdução deverá beneficiar o próprio processo legislativo orçamentário nacional, à medida que incorporará várias regras de cunho normativo geral, isto é, aplicáveis também para as demais esferas federadas, além de normas já aplicadas na esfera federal,que são, a cada ano, inseridas nas leis de diretrizes orçamentárias e que já deveriam estar consolidadas como regramento perene”, explica.
Medidas Legislativas Complementares
O economista ainda ressaltou que a responsabilidade fiscal tem na apreciação das contas do Presidente da República pelo Congresso importante pilar institucional, mas a prerrogativa parlamentar acaba esvaziada se for intempestiva. As contas do governo Collor (1990-1992) ainda aguardam parecer.
“A falta de prazos para apreciação de contas destoa do prazo fixo de 60 dias para apresentação das contas pelo Presidente da República e do prazo de 60 dias para emissão de parecer pelo TCU”, ressalta.
Para ele, o estabelecimento de prazo específico é uma necessidade para o exercício tempestivo da função fiscalizadora do Congresso Nacional, uma de suas prerrogativas básicas. Isso porque eventual reprovação de contas, por exemplo no primeiro semestre do ano seguinte ao ano de prestação das contas, pode constituir fato político relevante, além de subsidiar a sociedade sobre a qualidade do gestor público, permitindo-lhe formar melhor julgamento acerca da conveniência da reeleição de um político ou não. Trata-se de importante omissão de controle fiscal.
Também decorre daí a necessidade de sanção mais efetiva a políticos com contas reprovadas. Sanções de baixo custo ao agente político são ineficazes para coibir crime de responsabilidade, ou o desvio da conduta esperada do gestor público. No caso, a sanção de inelegibilidade política do mandatário com contas reprovadas não afeta o curso do próprio mandato, o que não gera uma preocupação tempestiva de curto prazo para o político, nem a concomitante aderência às normas de finanças públicas. Talvez seja a hora de aprimorar as regras de gestão com foco nesse horizonte temporal.
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