terça-feira, 9 de abril de 2019

O papel dos Tribunais de Contas no controle das renúncias de receitas.


A partir da auditoria realizada em 2017 pelo Tribunal de Contas do Município de São Paulo (TCMSP), tratando pela primeira vez especificamente da avaliação dos controles relacionados às renúncias de receitas praticadas pela Prefeitura da Capital Paulista, o auditor Jorge Pinto de Carvalho Júnior, servidor do próprio Tribunal, escreveu o artigo “Auditoria de renúncia de receitas: ampliação do escopo do controle externo exercido pelos tribunais de contas para além da despesa”. Nele, o autor ressalta a necessidade de os tribunais de contas incluírem em suas atividades de controle externo a fiscalização das renúncias de receitas, uma medida que alcançou grandes proporções nas gestões de todos os entes federativos – União, Estados e Munícipios –, com impacto nas contas públicas.

“Entende-se como renúncia [...] o montante de ingressos financeiros que a administração pública deixa de receber ao instituir um tratamento diferenciado a determinado contribuinte que o exime do cumprimento literal da legislação vigente, no que tange ao dever de recolher valores a título de tributos (renúncias fiscais) ou outras origens de receita (renúncias não fiscais)”, explica o auditor. A utilização desse recurso por parte do poder público compreende, entre outras medidas, incentivos fiscais, anistias, subsídios, alteração de alíquotas de base de cálculo para reduções de tributos ou contribuições.

Para ter ideia do montante envolvido nesse tipo de operação, o técnico do TCMSP destaca o parecer prévio do Tribunal de Contas da União (TCU) acerca das contas de 2017 do presidente da República. No documento, o TCU, um dos poucos órgãos do sistema tribunais de contas do Brasil que, segundo Jorge de Carvalho, não se limita apenas ao exame da despesa governamental, aponta que, em 2017, o Governo Federal deixou de arrecadar R$ 354,72 bilhões com renúncias, o equivalente a 5,4% do Produto Interno Bruto (PIB). Desse valor, R$ 270,40 bilhões foram relativos a benefícios tributários e R$ 84,32 bilhões decorrentes de benefícios financeiros e creditícios. 

Como ressalta Jorge de Carvalho em seu artigo, essas medidas podem representar um instrumento valioso na busca de melhores políticas públicas, caso sejam concebidas e acompanhadas de maneira apropriada. No entanto, apesar de representarem recursos vultosos, os tribunais de contas ao exercerem o controle externo têm focado sua atuação, com exceção do TCU, no exame da execução do gasto público, ou seja, da despesa em detrimento do acompanhamento da regular arrecadação de receitas e de eventuais renúncias concedidas, bem como dos resultados advindos desse benefício concedido a alguns setores econômicos e sociais. 

Para o auditor do TCMSP, é importante as Cortes de Contas terem um olhar mais atento às renúncias, uma vez que tal prática significa “abrir mão de recursos que viabilizariam não só o financiamento de investimentos previstos nos instrumentos de planejamento do Estado, mas também do custeio da máquina pública”. Ainda mais na situação de crise fiscal pela qual passa o Brasil. Mais uma vez citando o parecer prévio do TCU na análise das contas da Presidência da República, em 2017, Jorge de Carvalho destaca que o déficit primário da União naquele ano foi de R$ 119,4 bilhões (pela variação do endividamento líquido) diante de uma renúncia de receitas que chegou a R$ 354,72 bilhões.

No caso da auditoria realizada pelo TCMSP, em 2017, para avaliar a adequação dos controles relacionados às renúncias de receitas praticadas pelo Executivo paulistano (TC 72.012.015/17-88), os técnicos do Tribunal levantaram que havia naquele ano 50 leis municipais em vigor tratando sobre renúncia e outros 186 projetos de lei em tramitação na Câmara Municipal tratando do mesmo tema, o que indicava grande risco de as renúncias impactarem negativamente o equilíbrio das contas públicas municipais. Mesmo porque o trabalho da Auditoria do Tribunal comprovou que o setor responsável pela quantificação da receita tributária na Secretaria da Fazenda não possuía informações pormenorizadas sobre o montante efetivamente renunciado. Ou seja, o impacto das finanças municipais era desconhecido.

Um dos vários procedimentos de renúncia de receita testado pelos técnicos do TCMSP foi o decorrente da Lei Municipal nº 15.931/2013, cujo objetivo é promover e fomentar o desenvolvimento de áreas periféricas, incentivando a instalação de empresas que utilizem mão de obra intensiva e gerem muitos empregos. Para avaliar o resultado dessa política foram selecionadas cinco empresas sediadas na zona leste da Capital Paulista que gozavam de benefícios fiscais. O resultado das visitas realizadas a esses locais para verificar a existência e efetiva prestação de serviços que justificassem tais incentivos fiscais previstos na lei revelou “que dois dos contribuintes estavam domiciliados em um único imóvel e que não havia qualquer prestação de serviço no local”. Mais: havia uma única funcionária responsável por recolher a correspondência e as salas não possuíam móveis, encontrando-se completamente vazias. Uma terceira empresa não foi localizada no endereço cadastrado e os vizinhos relataram desconhecer sua existência, o que caracterizava a utilização simulada de endereço apenas para usufruto dos incentivos fiscais previstos em lei. O valor total renunciado para esses contribuintes foi de R$ 4,59 milhões.

O artigo “Auditoria de renúncia de receitas: ampliação do escopo do controle externo exercido pelos tribunais de contas para além da despesa” pode ser lido na íntegra aqui.

O relatório realizado, em 2017, pela Auditoria do TCMSP em relação às renúncias de receitas por parte da Prefeitura de São Paulo pode ser acessado aqui.

Fonte: TCMSP - Tribunal de Contas do Município de São Paulo

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