quarta-feira, 28 de fevereiro de 2018

Itália incentiva denúncia e delação para combater corrupção política.

Para porta-voz de agência, consciência do público levou à redução da tolerância aos delitos


Lembrada pela máfia e pela Operação Mãos Limpas dos anos 1990, a Itália avançou 18 posições no índice de percepção de corrupção nos últimos cinco anos. A melhora nessa área central às eleições de 4 de março é atribuída à aprovação de leis em 2012 e à criação da Agência Nacional Anticorrupção em 2014.
 
A Itália foi da 72ª posição à 54ª, enquanto o Brasil está em 96° entre 180 países. Mas o índice, publicado na semana passada pela Transparência Internacional, se baseia na opinião de especialistas sobre o setor público, e não na da população. Ainda há queixas, alimentando partidos como o 5 Estrelas, com discurso contrário à política tradicional e favorito na votação.
 
Uma das novas armas da legislação italiana é o incentivo às denúncias feitas por servidores públicos. "A corrupção é muito difícil de ser descoberta porque nem o corrupto nem o corrompido têm interesse de torná-la pública", diz à Folha Paolo Fantauzzi, porta-voz da Agência Nacional Anticorrupção.
 
"Essas leis são uma oportunidade para os funcionários públicos que têm informações sobre corrupção ou má administração relatarem o que sabem. Protegemos essas pessoas de serem demitidas ou punidas publicamente, se isso for ligado às denúncias."
 
Outra ferramenta é a delação premiada, como a utilizada no Brasil. "Esse sistema levou a grandes resultados no combate à máfia, porque removeu a sensação de que eles eram intocáveis", diz. A medida foi expandida em 2015.
 
Folha - A agência foi criada em 2014 e, segundo a Transparência Internacional, contribuiu para reduzir a percepção de corrupção. Qual é a estratégia?
 
Paolo Fantauzzi - A crença é de que os procedimentos corretos, garantindo a competição, reduzem o risco de corrupção. A agência atua na prevenção da corrupção, em especial ajudando o setor público a fazer suas licitações e contratos de maneira correta.
 
Um dos instrumentos da agência é o incentivo aos denunciantes. Qual é a importância deles no combate à corrupção?
 
A corrupção é muito difícil de ser descoberta porque nem o corrupto nem o corrompido têm interesse de torná-la pública. Dessa maneira, a lei é uma oportunidade para funcionários públicos que têm informações sobre corrupção ou má administração relatarem o que sabem.
 
Protegemos essas pessoas de serem demitidas ou punidas publicamente, se isso for relacionado a suas denúncias. A lei permite o anonimato das denúncias feitas diretamente à agência, que recebeu cerca de 200 delas desde o início do ano e 580 durante 2017.
 
O índice mede a percepção, e não a corrupção em si. Qual é a diferença?
 
Não existem instrumentos científicos para medir a corrupção, mas estamos trabalhando nisso em parceria com o instituto italiano de estatísticas. Hoje é impossível dizer se a corrupção diminuiu. É claro que uma percepção de corrupção mais baixa é um sinal de uma confiança maior entre os italianos em suas instituições, e isso é algo positivo.
 
A Itália lida há bastante tempo com a corrupção. Há a sensação de que a corrupção já seja normal?
 
O fator cultural tem um papel importante quando falamos de corrupção. Você pode enviar corruptos à prisão, mas se a mentalidade não mudar, as pessoas que tomarem seu lugar podem fazer o mesmo.
 
Por isso é essencial haver um esforço para que os cidadãos tenham consciência dos danos causados em seu dia a dia pela corrupção.
 
Por exemplo, com o desperdício de dinheiro, com a fuga de cérebros e com a ausência de meritocracia. Até os anos 1980 na Itália havia alguns, incluindo políticos, que diziam que a máfia não existia. Hoje ninguém diria isso.
 
O que mudou? Principalmente, a consciência do público.
 
Há debate no Brasil sobre métodos investigativos como delações premiadas. O que se pensa na Itália?
 
Na Itália esse sistema levou a grandes resultados no combate à máfia, porque removeu a sensação de que eles eram intocáveis. A delação premiada foi expandida na Itália em 2015 para incluir também os julgamentos de corrupção, permitindo mitigar de um terço a dois terços da sentença aos indiciados que colaborem com a Justiça.
 
Fonte: Folha de São Paulo (www.folha.uol.com.br - Por: Diogo Bercito)

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