Por Giuseppe Giamundo Neto e Fernanda Leoni
O julgamento do Recurso Extraordinário nº 636.899 pelo Supremo Tribunal Federal, que fixou, em Repercussão Geral, o Tema 899, definindo a prescritibilidade das pretensões dos Tribunais de Contas, certamente foi um divisor de águas acerca da matéria, impondo às Cortes de Contas repensarem a forma com que conduziam os processos de controle sob a sua jurisdição.
Mesmo com alguma resistência inicial, em parte ocasionada pela própria indefinição do julgado do STF acerca da amplitude da decisão — se a prescrição referenciada alcançava apenas a execução das decisões ou também a própria ação de controle —, os Tribunais de Contas iniciaram um movimento de regulamentação interna do tema.
Uma importante contribuição nesse sentido adveio da atuação dos órgãos representativos desses tribunais, na figura da Atricon (Associação dos Membros dos Tribunais de Contas do Brasil), do Instituto Rui Barbosa, do CNPTC (Conselho Nacional de Presidentes dos Tribunais de Contas) e da Abracom (Associação Brasileira dos Tribunais de Contas dos Municípios) que, em conjunto, editaram a Nota Recomendatória nº 02/2023, recomendando o reconhecimento e adoção da prescrição das pretensões punitiva e ressarcitória pelos tribunais.
Certamente a regulamentação de maior destaque adveio do Tribunal de Contas da União, dada a referência para os demais órgãos de controle. A Resolução nº 344/2022, publicada em 11/10/2022, dispõe de forma detalhada acerca do prazo quinquenal para o exercício das pretensões punitiva e de ressarcimento, indicando seus marcos iniciais, possíveis interrupções e suspensões, e demais regras de aplicação interna.
Também optaram por regular a matéria por meio de normativos internos próprios os Tribunais de Contas do Ceará, do Maranhão, do Pará, da Paraíba, do Distrito Federal, dos Municípios de Goiás e do Município de São Paulo.
Dentre os tribunais que passaram a prever a prescrição de forma expressa, somente para o Tribunal de Contas do Amazonas houve a alteração diretamente no texto da Constituição Estadual, cuja Emenda nº 132/2022, ao incluir o artigo 40, §4º à norma, passou a contemplar a prescrição punitiva e ressarcitória das fiscalizações a cargo do tribunal.
Já os Tribunais de Contas do Piauí, de Santa Catarina e dos municípios do Pará promoveram alterações em sua própria Lei Orgânica, passando a prever a prescrição também de forma ampla. No caso desse último (TCM-PA), também já foram promovidas alterações em seu regimento interno para comportar as novas disposições da Lei Orgânica.
No caso do Tribunal de Contas de Mato Grosso do Sul, as alterações para a previsão da prescrição foram feitas diretamente em sua Lei Orgânica. O Tribunal de Contas de Mato Grosso, por sua vez, possui todo um Código de Processo de Controle Externo, que recentemente passou por alterações para contemplar a prescrição.
Importante notar que muitos tribunais já possuíam regulamentação específica antes do precedente do Supremo Tribunal Federal, mas apenas no que tange à prescrição da pretensão punitiva. É o caso dos Tribunais de Contas de Alagoas, do Espírito Santo, de Goiás, de Minas Gerais, de Pernambuco, do Rio Grande do Norte, de Roraima, de Sergipe e dos municípios da Bahia.
Alguns poucos tribunais mantêm a temática regulada apenas por julgados com força vinculante. É o caso do Tribunal de Contas da Bahia (Verbete de Súmula 17), do Paraná (Prejulgado nº 26), de Rondônia (Decisão Normativa 01/2018/TCE-RO) e do Município do Rio de Janeiro (Enunciados 166, 362, 382 e 410). Com exceção deste último, todos os julgados mencionados contemplam apenas a prescrição da pretensão punitiva.
Por fim, ainda relevante destacar que existem alguns tribunais que não regulamentaram a matéria, embora parte deles eventualmente aplique o instituto em sua jurisprudência, como ocorre com o Tribunal de Contas do Acre, que aplica a Resolução nº 344/2022, do TCU, como referência. Os Tribunais de Contas de Amapá, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul e São Paulo ainda não editaram normas sobre a matéria.
O balanço, portanto, é positivo, e demonstra um esforço importante dos Tribunais de Contas na preservação da segurança jurídica. Com exceção de cinco tribunais, que não regulamentaram o tema, todos os demais apresentam alguma disposição sobre a matéria, seja ela anterior ao precedente do STF (nove tribunais), seja em forma de julgados de força normativa ou equivalente (quatro tribunais), seja pela promoção de adequações em sua legislação (14 tribunais).
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Giuseppe Giamundo Neto é doutorando e mestre em Direito do Estado pela USP (Universidade de São Paulo), advogado e sócio do Giamundo Neto Advogados, professor do IDP (Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa) em Brasília e secretário-adjunto da Comissão Nacional de Direito da Infraestrutura da OAB.
Fernanda Leoni é doutoranda e mestre em Políticas Públicas pela UFABC (Universidade Federal do ABC), especialista em Direito Público pela Escola Paulista de Magistratura, bacharel em Direito pela PUC-SP e advogada do Giamundo Neto Advogados.
Fonte: CONJUR - Revista Consultor Jurídico